segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A intimidade intimida
pois nem sempre é bela
e raramente é falada
de peito aberto.

A intimidade é para poucos,
é para aqueles que não julgam
e que não destroem
com um olhar a fantasia.

A intimidade intima
à verdade
à dor, à culpa,
ao medo de não ser mais.

A intimidade não perdoa,
pois se intitula real,
traz conflitos, paradoxos,
sonhos esquecidos.

A intimidade se mostra
na despretensão de ser o que se é,
na crueza da alma,
na palavra perdida.


(Intimidade - Adriana Roitman)

(imagem: Roberto Ploeg)

Pensava a mil por hora e por isso andava sempre cansada...
Achava ter a vida uma beleza exaustiva e alinhar os pensamentos dava-lhe muito trabalho.
Costumava costurá-los como uma colcha de retalhos, mas não suportava cobrir-se com ela.
Foi quando, em um dia estranhamente verde, um gato entrou por sua janela, e, ao puxar um fio, desfez toda a colcha que estava sobre a cômoda, emaranhou-se em linhas e desapareceu no horizonte.
E ela então, obtendo alguns instantes de pausa ao perder os pensamentos, encontrou-se em sua essência e sorriu sinceramente.

(Um conto vazio por Anna Carolina Paegle)

sábado, 29 de agosto de 2009

“…e essa falta cresce à cada dia, de forma avassaladora…
quando enfim penso que estou me acostumando, que estou te esquecendo,
você ressurge de forma inesperada ocupando todos os espaços, transbordando de
dentro de mim... e é nessa inconstante loucura que vivo sem te ter.”

(Caio Fernando Abreu)

Tenho trabalhado tanto, mas sempre penso em você.
Mais de tardezinha que de manhã, mais naqueles dias que parecem poeira assentada e com mais força quando a noite avança.
Não são pensamentos escuros, embora noturnos…
Sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você.
Eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e desamar era não mais conseguir ver, entende?
Eu quis tanto ser a tua paz, quis tanto que você fosse o meu encontro.
Quis tanto dar, tanto receber.
Quis precisar, sem exigências.
E sem solicitações, aceitar o que me era dado.
Sem ir além, compreende?
Não queria pedir mais do que você tinha, assim como eu não daria mais do que dispunha, por limitação humana.
Mas o que tinha, era seu.
Mas se você tivesse ficado, teria sido diferente?
Melhor interromper o processo em meio: quando se conhece o fim, quando se sabe que doerá muito mais — por que ir em frente?
Não há sentido: melhor escapar deixando uma lembrança qualquer, lenço esquecido numa gaveta, camisa jogada na cadeira, uma fotografia — qualquer coisa que depois de muito tempo a gente possa olhar e sorrir, mesmo sem saber por quê.
Melhor do que não sobrar nada, e que esse nada seja áspero como um tempo perdido.
Tinha terminado, então. Porque a gente, alguma coisa dentro da gente, sempre sabe exatamente quando termina.
Mas de tudo isso, me ficaram coisas tão boas.
Uma lembrança boa de você, uma vontade de cuidar melhor de mim, de ser melhor para mim e para os outros.
De não morrer, de não sufocar, de continuar sentindo encantamento por alguma outra pessoa que o futuro trará, porque sempre traz, e então não repetir nenhum comportamento.
Ser novo.
Mesmo que a gente se perca, não importa.
Que tenha se transformado em passado antes de virar futuro.
Mas que seja bom o que vier, para você, para mim.
Te escrevo, enfim, me ocorre agora, porque nem você nem eu somos descartáveis.
. . . E eu acho que é por isso que te escrevo, para cuidar de ti, para cuidar de mim – para não querer, violentamente não querer de maneira alguma ficar na sua memória, seu coração, sua cabeça, como uma sombra escura.

(Caio F Abreu)
"As mãos.
Gosto dos gestos da tuas mãos.
São imensos.
Não se limitam aos limites.
São harmoniosos, ainda que fortes e decididos.
Mas harmoniosos.
São largos.
Abarcando uma imensidão de vidas e sensibilidades.
E dizem tanto!"

(http://abandonome.blogspot.com/)

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

O que me atormenta é que tudo é "por enquanto",
nada é "sempre".

(Clarice Lispector)
"é saber que tudo se move a nossa volta, tudo se transforma e, até mesmo quando nos recusamos a acompanhar a dança da vida, sem percebermos, ela nos tira pra dançar, nos envolve com um ritmo novo. Quando isso acontece? quando nos abrimos para a magia de viver e respirar as entrelinhas, os silêncios."

(Caio Fernando Abreu)
Cultivo você em mim
como a uma orquídea, à sombra.
Cultivo você em mim
desta forma delicada, às vezes, travessa.
Cultivo você em mim
com certo desamparo e silêncio.
Cultivo você e a mim
com o zelo de um jardineiro ao seu jardim.

(Daniel Fernando Ribeiro)

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Tô exausto de construir e demolir fantasias.
Não quero me encantar com ninguém.
(Caio F de Abreu)
Seria tão bom se pudéssemos nos relacionar sem
que nenhum dos dois esperasse absolutamente nada,
mas infelizmente nós, a gente, as pessoas, têm, temos
- emoções.

(Caio F. de Abreu)
Não se preocupe, não vou tomar nenhuma medida drástica,
a não ser continuar, tem coisa mais auto destrutiva
do que insistir sem fé nenhuma?
Ah, passa devagar a tua mão na minha cabeça, toca
meu coração com teus dedos frios,
eu tive tanto amor um dia.

(Caio F. de Abreu)
Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem.

(Caio F. de Abreu)
Mas sempre me pergunto por que, raios,
a gente tem que partir.
Voltar, depois, quase impossível.

(Caio F de Abreu)

Sim, deve ter havido uma primeira vez, embora eu não
lembre dela, assim como não lembro das outras vezes,
também primeiras, logo depois dessa em que nos
encontramos completamente despreparados para esse
encontro. E digo despreparados porque sei que você não
me esperava, da mesma forma como eu não esperava você.
Certamente houve, porque tenho a vaga lembrança -
e todas as lembranças são vagas, agora -, houve um tempo
em que não nos conhecíamos, e esse tempo em que
passávamos desconhecidos e insuspeitados um pelo outro,
esse tempo sem você eu lembro. Depois, aquela primeira
vez e logo após outras e mais outras, tudo nos conduzindo
apenas para aquele momento.

(Caio Fernando de Abreu)
Sabe, para mim a vida é um punhado de lantejoulas
e purpurina que o vento sopra.
Daqui a pouco tudo vai ser passado mesmo
- deixa o vento soprar, let it be, fique pelo menos
com o gostinho de ter brilhado um pouco...

(Caio F. de Abreu)

terça-feira, 25 de agosto de 2009

o seu olhar lá fora
o seu olhar no céu
o seu olhar demora
o seu olhar no meu

o seu olhar seu olhar melhora
melhora o meu

onde a brasa mora
e devora o breu
como a chuva molha
o que se escondeu

o seu olhar seu olhar melhora
melhora o meu

o seu olhar agora
o seu olhar nasceu
o seu olhar me olha
o seu olhar é seu

o seu olhar seu olhar melhora
melhora o meu

(Arnaldo Antunes)
É mais fácil amar o retrato.
Eu já disse que o que se ama é a "cena".
"Cena" é um quadro belo e comovente que existe
na alma antes de qualquer experiência amorosa.
A busca amorosa é a busca da pessoa que,
se achada,irá completar a cena.
Antes de te conhecer eu já te amava....
E então, inesperadamente, nos encontramos
com rosto que já conhecíamos antes de o conhecer.
E somos então possuídos pela certeza absoluta
de haver encontrado o que procurávamos.
A cena está completa. Estamos apaixonados.

(Rubem Alves)
Aprenda a gostar, mas gostar mesmo, das coisas
que deve fazer e das pessoas que o cercam.
Em pouco tempo descobrirá que a vida é muito boa
e que você é uma pessoa querida por todos.

(Rubem Alves)
Todos os dias o ciclo se repete,
às vezes com mais rapidez,
outras mais lentamente.
E eu me pergunto se viver não será
essa espécie de ciranda de sentimentos
que se sucedem e se sucedem e deixam
sempre sede no fim.

(Caio Fernando de Abreu)
Me explica, que às vezes tenho medo.
Deixo de ter, como agora, quando o vento cessa
e o sol volta a bater nos verdes.
Mesmo sem compreender, quero continuar aqui
onde está constantemente amanhecendo.

(Caio Fernando de Abreu)
"Não é saudade, porque para mim a vida é dinâmica
e nunca lamento o que se perdeu - mas é sem dúvida
uma sensação muito clara de que a vida escorre
talvez rápida demais e, a cada momento,
tudo se perde."

(Caio Fernando de Abreu)
Meu coração é um entardecer de verão,
numa cidadezinha à beira-mar.
A brisa sopra, saiu a primeira estrela.
Há moças na janela, rapazes pela praça,
tules violetas sobre os montes onde o sol se põe.
A lua cheia brotou do mar.
Os apaixonados suspiram.
E se apaixonam ainda mais.

(Caio Fernando de Abreu)

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

" Voltar é uma ilusão.
Estamos sempre indo."

(Cláudio Marzo)
A felicidade é um susto.
Chega na calada da noite, na fala do dia,
no improviso das horas.
Chega sem chegar, insinua mais que propõe...
Felicidade é animal arisco.
Tem que ser admirada à distância
porque não aceita a jaula que preparamos para ela.
Vê-la solta e livre no campo,
correndo com sua velocidade tão elegante
é uma sublime forma de possuí-la.

(Fábio de Melo)
Tudo fica mais cinza,mais triste, sem graça
e sem cor, sem o seu abraço e palavras,
para dividirem o pouco que sei.
Não sei o que mais me
faz falta...Se é seu toque
em meu cabelo, ou a falta
de sua imagem cristalina
em minha mente.

(Caio F. Abreu)
Eu quero amar,
amar perdidamente.
Amar só por amar.

(Florbela Espanca)

domingo, 23 de agosto de 2009

Quanta ternura cabe um abraço...
receba o meu e conte..

(Carlos Drumond de Andrade)
Só este silêncio é minha prece, Senhor,
e não sei dizer mais.
Sou tão feliz em sentir que me calo para sentir mais.

(Clarice Lispector)
...tão bonito, o outro rosto sob seus olhos
e tão macia a pele do outro rosto sob seus dedos,
que num impulso aproximou ainda mais seu próprio rosto.

(Caio.F.Abreu)
Você disse que não sabe se não
Mas também não tem certeza que sim
Quer saber?
Quando é assim
Deixa vir do coração
Você sabe que eu só penso em você
Você diz que vive pensando em mim
Pode ser
Se é assim
Você tem que largar a mão do não
Soltar essa louca, arder de paixão
Não há como doer pra decidir
Só dizer sim ou não
Mas você adora um se...

Eu levo a sério, mas você disfarça
Você me diz à beça e eu nessa de horror
E me remete ao frio que vem lá do sul
Insiste em zero a zero e eu quero um a um
Sei lá o que te dá que não quer meu calor
São jorge por favor me empresta o dragão
Mais fácil aprender japonês em braile
Do que você decidir se dá ou não

(Se - Djavan)
Embora eu saiba que de uma planta brota uma flor,
continuo surpreendida com os caminhos secretos da natureza.
E se continuo até hoje com pudor não é porque ache vergonhoso,
é por pudor apenas feminino.

Pois juro que a vida é bonita.

(Clarice Lispector)

sábado, 22 de agosto de 2009


Lágrimas abatem-se nas minhas vidraças…
Lágrimas de um céu cinzento.
Mesmo que alguns raios luminosos teimem em
trespassar a escuridão.
Tudo é irrelevante e o inverno chora...
Um grito molhado pelo que não choramos.
Chora por cada um de nós, como se fosse uma catarse.
Se um dia pudesse conversar com o inverno perguntar-lhe-ia
porque se dá ao trabalho de chorar por nós.
Um dia a primavera surgirá com a renovação prometida sem
que nos apercebamos.
A natureza renova-se sem nos pedir permissão, sem nós.
E será com o calor do verão que chegará uma leve sensação
de equívoco.
Não que nos apercebamos dessa sensação.
Apenas a humidade latente que nos enleia - a par de uma
lassidão que não nos abandonará até que o calor abdique -
é como o “tic tac” silencioso mas inexorável de um relógio.
E é então que começa o cair da folha.
E de novo o circuito se encerrará até o inverno se imiscuir
por nós adentro, chorando.

(Raquel Vasconcelos)

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

O amor que eu nunca
fiz tinha cheiro de pecado
Tinha um monte de carinhos guardados
Tinha início num simples beijo
Que terminava envolto em milhões de desejos..
O amor que eu nunca fiz era criança
Era alucinado e acalorado
Depois virou adolescente e carente
Mais tarde, um senhor
Triste e empalhado
Escondido dentro do passado.

O amor que eu nunca fiz
Tinha cheiro de jasmim
Perfume de alecrim
A cor da aurora
Teria sido um instante de glória
Talvez o começo de uma história.
Chamava por mim
Sempre foi assim...

No silêncio da madrugada
Em alguma hora encantada...
Ele era fantasiado de alegria
Escondido atrás da agonia
Quente e louco
Perturbado e indiciplinado
Era medroso, cheio de angustias
Partículas de tormentos
Cheio de instantes e momentos.

O amor que eu nunca fiz
Me chamava, me enfeitiçava
Tentava me levar ao final da estrada
Mas minha fuga
Sempre era alucinada
Fuga de lágrimas, sem palavras.

O amor que eu nunca fiz era gelado
Frio e molhado
Doce e salgado
Fugitivo e enraizado
Seco e atormentado
Imperfeito e arruinado.

O amor que eu nunca fiz..
Me deixou marcas
Por toda parte
Por cada pedaço do meu corpo
Nos lábios e no rosto
No peito e na emoção
Na saudade e no coração.
Fugiu de mim
E sempre vai ser assim
Porque...

o amor que eu nunca fiz
Riu quando eu não quis
Embora eu saiba
Que dentro do seu coração
Ficou um vácuo
Uma ilusão
Uma estranha sensação...

Mas o amor que eu não fiz
Ainda me atormenta
Ainda me alimenta
Ainda não se satisfaz
Ainda não é capaz.

O amor que eu nunca fiz
De certa forma eu já fiz
Quando olhei nos seus olhos
Quando beijei a sua boca
Quando fiquei completamente louca
Quando nas noites de verão
Peguei na sua mão
Quando o seu corpo encostou no meu
E enlouquecida eu quis o seu.

O amor que eu nunca fiz
Abriu-me uma porta
Iniciou uma história
De derrota e de glória
De despedida e partida
De amizade sofrida
De paixão, amor e dor.

O amor que eu jamais fiz
Foi nosso peso
Foi nossa medida
Nosso pesadelo
E nossa dívida
Foi nosso desespero
E ficou sendo também
O nosso segredo.

O amor que eu nunca fiz
Foi justamente, de todos...
o que eu mais quis!

(Silvana Duboc)
Sonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas
que aparecem em seus caminhos.
A felicidade aparece para aqueles que choram.

Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem a importância
das pessoas que passam por suas vidas.

(Clarice Lispector)
Como não dizer que foi amor
Se o que senti mudou minha vida
Se mesmo deixando como presente a dor
Fez a minha história mais colorida.

Como colocar uma pá de cal
Pensando que assim se põe um ponto final
Se em meu corpo ainda há o calor
Há o perfume e as marcas deste amor.

Palavras podem ser jogadas ao vento
Como forma de manipular olhares
Mas não mata os sentimentos.

O tempo muda as estações, faz um novo verão
Refaz o velho, traz o novo, transforma o momento
Porém não desfaz o que se enraizou no coração.

(Ataíde Lemos)
Há um sentido profundo
Na superficialidade das coisas,
Uma ordem inalterável
No caos aparente dos mundos.

Vibra um trabalho silencioso e incessante
Dentro da imobilidade das plantas:
No crescer das raízes,
No desabrochar das flores,
No sazonar das frutas.

Há um aperfeiçoamento invisível
Dentro do silêncio de nosso Eu:
Nos sentimentos que florescem,
Nas idéias que voam,
Nas mágoas que sangram.

Uma folha morta
Não cai inutilmente.
A lágrima não rola em vão.
Uma invisível mão misericordiosa
Suaviza a queda da folha,
Enxuga o pranto da face.

(Helena Kolody)

quarta-feira, 19 de agosto de 2009


Me queira bem.
Estou te querendo muito bem neste minuto.
Tinha vontade que você estivesse aqui e eu
pudesse te mostrar muitas coisas, grandes,
pequenas, e sem nenhuma importância, algumas.
Fique feliz, fique bem feliz, fique bem claro, queira ser feliz,
[...]Mesmo que a gente se perca, não importa.
Que tenha se transformado em passado antes de virar futuro.
Mas que seja bom o que vier, para você, para mim."

(Caio Fernando de Abreu)

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Doce lembrança orvalhada
de madrugadas antigas.
Fumaça de chaminé
subindo na manhã fria.
Florida malva-rosa
debruçada no jardim.
Uma revoada de sonhos
na vida que amanhecia.
Cantiga de recordar...
Ai! Que saudade de mim!

(Helena Kolody)
bobagem a gente pensar que passa...
que o tempo passa,
que os dias voam,
que a fila anda,
que a vida segue,
se o passado revive
se a lembrança persegue,
se não há tempo que carregue
o desejo de ficar à toa
no pensamento, numa saudade boa,
em uma vontade, em um sossego,
em uma pessoa

(Cáh Morandi)

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Preciso do teu silêncio
cúmplice
sobre minhas falhas.
Não fale.
Um sopro, a menor vogal
pode me desamparar.
E se eu abrir a boca
minha alma vai rachar.
O silêncio, aprendo,
pode construir. É um modo
denso/tenso
- de coexistir.
Calar, às vezes,
é fina forma de amar.

(Affonso Romano de Sant'Anna)
"Seja como for, continuo gostando muito de você
- da mesma forma -, você está quase sempre
perto de mim, quase sempre presente em memórias,
lembranças, estórias que conto às vezes,
saudade."

(Caio Fernando Abreu)

"Você vai me abandonar e eu nada posso fazer para impedir.
Você é meu único laço, cordão umbilical, ponte entre o aqui de dentro e o lá de fora.
Te vejo perdendo-se todos os dias entre essas coisas vivas onde não estou.
Tenho medo de, dia após dia, cada vez mais não estar no que você vê.
E tanto tempo terá passado, depois, que tudo se tornará cotidiano e a minha ausência não terá nenhuma importância.
Serei apenas memória, alívio, enquanto agora sou uma planta carnívora exigindo a cada dia uma gota de sangue para manter-se viva.
Você rasga devagar o seu pulso com as unhas para que eu possa beber.
Mas um dia será demasiado esforço, excessiva dor, e você esquecerá como se esquece um compromisso sem muita importância.
Uma fruta mordida apodrecendo em silêncio no quarto."

(Caio Fernando Abreu)
"Não se pode ser infeliz,
não se pode morrer em vida,
não se pode desistir de amar, de criar.
Não se pode: é pecado, é proibido (...)
Não é possível adiar a vida"

(Caio Fernando Abreu)

Há pessoas que nos fazem voar.
A gente se encontra com elas e leva um bruta susto.
Primeiro, porque o vento começa a soprar dentro da gente,
e lá de cantos escondidos de nossas montanhas e florestas
internas, aves selvagens começam a bater asas, e a gente
não sabia que tais entidades mágicas moravam dentro
de nós, elas nos surpreendem e nos descobrimos mais
selvagens, mais bonitos, mais leves, com uma vontade
incrível de subir até as alturas, saltando de penhascos...

(Rubem Alves)

domingo, 16 de agosto de 2009

De qualquer forma,
poderia tê-lo amado muito.
E amar muito, quando é permitido,
deveria modificar uma vida.

(Caio Fernando Abreu)
Está tudo planejado:
se amanhã o dia for cinzento,
se houver chuva
se houver vento,
ou se eu estiver cansado
dessa antiga melancolia
cinza fria
sobre as coisas
conhecidas pela casa
a mesa posta
e gasta
está tudo planejado
apago as luzes, no escuro
e abro o gás
de-fi-ni-ti-va-men-te
ou então
visto minhas calças vermelhas
e procuro uma festa
onde possa dançar rock
até cair

(Caio Fernando de Abreu)
Aqui é dor, aqui é amor, aqui é amor e dor:
onde um homem projeta seu perfil e pergunta atônito:
em que direção se vai?

(Adélia Prado: O Coração Disparado)
Não sei se te procuro,
Mas sinto-te !
Não sei se de ti preciso,
Mas bebo o teu cheiro !
Não sei se me persegues,
Mas oiço os teus passos !
Não sei que me fazes,
Que necessito da tua Paz !
Deixa-me contar-te um segredo,
Silêncio amigo...
Eu gosto de ti !

(Jorge Bites)

Eu ainda penso muito em você.
Penso tanto que esqueço até de mim
Penso em você pela manhã,
E durante o resto do dia
Penso em você a noite
E ainda nos meus sonhos
Penso muito em você
As vezes com raiva
As vezes com saudades
As vezes com carinho
As vezes com um desejo louco,
de pensar mais em você.
Penso em você sorrindo
Aquele riso contagiante,
E fico triste,
As vezes penso em você chorando
Um choro de fraqueza,e fico alegre
Talvez sinta minha falta,
quando chora
Ou nem se lembre, quando rí
Penso em você assim,
de todas as formas
As vezes penso tanto
Que esqueço de mim.
Minha vida tem sido assim
Pensamentos que tentam chegar até você
pensamentos que me deixam confuso
Pois o pensar é muito distante
e nossa distancia não me faz bem
Fico na dúvida e na indecisão
Mas o que posso fazer se
Eu só consigo
pensar em você!

(Ricardo JP)

Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma...
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem
sem fatalidade o olhar extático da aurora.

(Vinicius de Moraes)