quarta-feira, 11 de junho de 2008

Serenata - Frei Betto


Você gosta de serenata? Talvez nem saiba o que é isso. É um trovador, abraçado ao violão, cantando seu coração apaixonado ao pé de sua janela, noite adentro. Quem hoje faz serenata? Morreu o amor? Não, morreu o encanto do amor. Tudo hoje é medido em custo e benefício. Há quem faça serenata. Desde que você pague o valor de mercado. E caso se atreva a fazê-la gratuitamente, corre o risco de ser abordado pela polícia, sob o pretexto de que prejudica o sono alheio. Menos o de sua amada, evidentemente.

O capitalismo é inimigo do romance. Porque pensa em números. E números lucrativos. Romeu e Julieta teriam, agora, de pagar direitos autorais, e os trovadores da Idade Média seriam processados como usurpadores por interpretarem melodias sem recolher os devidos direitos autorais.

O capitalismo tornou o mundo mais rico e, a alma, mais pobre. Veja o exemplo da esbelteza física. Todo mundo quer ficar mais magro, esbelto, sarado, não para a própria felicidade ou a da amada, mas para a felicidade dos olhos alheios. O sujeito, ou a sujeita sem querer sujar a gramática passa fome, faz ginástica, malha o corpo, para que os outros o admirem, porque barriguinha e gordurinhas são, agora, consideradas anti-sociais, quase um acinte, quem sabe uma violação da lei da beleza. Caso de polícia, com os truculentos agentes da lei prendendo, na rua, todos que são gordos, velhos e feios.

Ouvi dizer que, em São Paulo, gente rica que namora deve assinar um termo de não exigência de bens. Porque se o amor durar mais de dois anos vale pedir direitos sobre o outro. Você acha que isso é poético? Ora, talvez ninguém mais saiba o que é poesia. Com exceção de Adélia Prado, Manoel de Barros, Ferreira Gullar, Moacyr Félix e uns tantos apaixonados.

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