
Amor esquizofrênico, por Fábio de Lima*
Hoje é dia dos namorados, não é?! Eu sabia que era desde às 5h15, quando acordei. Então, levantei e disse para mim mesmo que precisava ligar para minha namorada. Dar bom dia para ela. E o bom mesmo foi imaginar nosso encontro que ocorrerá à noite. No trabalho, assim que cheguei, me disseram que estou louco, porque estamos em outubro. Eu não sei do que essa gente está falando. Hoje é dia dos namorados. Eu sei que é.
Hoje é dia dos namorados, não é?! Eu passei no shopping, na hora do almoço, e comprei um hobby estampado com letras japonesas. Ele é branco e com os símbolos em preto. Lindo. Na vida aprendi que o amor tem de ser dito em todos os momentos. Nunca se sabe quando a oportunidade tornou-se passado e faz-se tarde para que a pessoa amada escute seu carinho. Hoje é dia dos namorados. Eu sei que é.
Hoje é dia dos namorados, não é?! Só acho estranho que Marina não tenha atendido ao telefone. Aliás, hoje, por algum motivo, está tudo muito estranho. Primeiro foram meus colegas do trabalho com aquela história ridícula de loucura. Depois aqueles barulhos estranhos de sirene. Um cheiro seco e adocicado que não sai do meu nariz e da minha boca. Logo hoje, dia de se manifestar o amor. Hoje é dia dos namorados. Eu sei que é.
Hoje é dia dos namorados, não é?! Mas Marina não atendeu meu telefonema e nem me ligou. Eu não vejo sorriso algum nas pessoas que me cercam. Parece que está chovendo, pois vejo pisadas molhadas no chão. Meu coração está batendo rápido demais para eu pensar. O que há? Qual escândalo sentimental apavora essa gente tão insensível que menospreza esse dia lindo? Hoje é dia dos namorados. Eu sei que é.
Hoje é dia dos namorados, não é?! E logo hoje meu corpo resolveu tremer de algo que não é medo. Os ponteiros dos relógios estão girando em sentido contrário. As flores estão extintas, segundo matérias de capas dos jornais. Cadê Marina? Cadê o amor que não mais vejo? Cadê meu desejo? A desesperança do mundo está me apertando nessa camisa branca cheia de amarras. Hoje é dia dos namorados. Eu sei que é.
Hoje é dia dos namorados, não é?! Por que minha família está chorando na minha frente? Por que estou mexendo a cabeça e meu corpo em sentidos desconexos? Que está fazendo essa seringa de injeção sobre meu poema de amor que acabei de escrever para Marina? São apenas 19h23 e todo mundo está querendo que eu durma. Essa gente não sabe que dia é hoje. Hoje é dia dos namorados. Eu sei que é.
Hoje é dia dos namorados, não é?! Até pensei em não ir trabalhar. Até pensei em fazer uma festa. Até pensei em fazer um filho hoje mesmo. Que divertido esses olhos esbugalhados de desalmados incrédulos no amor. Eles não entendem nada. Eu explicaria, mas estou com tanto sono. Acho que vou deixar para ver Marina um pouco mais tarde. Marina, meu amor, me leve nos seus braços enquanto durmo. Hoje é dia...!
(*) Jornalista e escritor, ou “contador de histórias”, como prefere ser chamado. Está escrevendo seu primeiro romance, DOCE DESESPERO, com publicação (ainda!) em data incerta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário